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terça-feira, 29 de setembro de 2015

Em 2004, camisinha era tabu para o COB

Em matéria publicada em 20 de junho de 2004, no Jornal O Globo, Rogério Daflon destacava que o Comitê Olímpico Brasileiro decidiu retirar as camisinhas dos kits que seriam entregues aos atletas. A justificativa é que poderia causar constrangimento aos casados. A matéria você confere, na íntegra, abaixo.

Entidade decide tirar preservativos de kits que serão distribuídos aos atletas olímpicos

Numa atitude polêmica, o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) resolveu tirar os preservativos do kit que todos os atletas receberão da Johnson & Johnson para as Olimpíadas de Atenas. Uma das justificativas da entidade mais comentada nos bastidores é o constrangimento que a inclusão da camisinha poderia causar aos homens e mulheres casados. Mas também foi levada em conta a preocupação com a imagem da delegação brasileira na Vila Olímpica.

Em nota enviada ao GLOBO pela assessoria de imprensa da entidade, o COB só admitiu o seguinte: "os preservativos vieram em um kit lacrado da Johnson. Quando isso foi percebido pelo COB, decidiu-se tirar esse item do kit, já que o mesmo é fornecido em larga escala pelo Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos a todos os habitantes da Vila Olímpica".

Os dirigentes do COB usaram como estratégia encobrir as razões da decisão. Transformaram assim um assunto trivial num tabu. Alguns atletas classificados para Atenas ficaram surpresos. Outros concordaram com a decisão. Foi o caso de Torben Grael, medalha de ouro nos Jogos de Atlanta-86, que afirmou que a divulgação de que o COB entregaria um kit com a inclusão de preservativo não somaria nada ao esporte e seria um assunto mais adequado a uma revista de fofoca.

- E pode dar a impressão de que a Vila Olímpica é uma orgia, o que não é verdade de jeito algum. Já basta o que foi divulgado na Austrália - disse Torben.

Nos Jogos de Sydney, em 2000, segundo a rádio australiana ABC, dez mil atletas que ocupavam a Vila Olímpica gastaram cerca de 50 mil preservativos. Seja como for, o velejador Marcelo Ferreira, parceiro de Torben na classe Star e na conquista do ouro em Atlanta, tem outra opinião.

- O fato de ter ou não a camisinha num kit não muda em nada a vida das pessoas. Isso é besteira. Outra coisa: fala-se muito que há orgias na Vila Olímpica. Nunca soube de uma. Isso é uma grande lenda - disse Marcelo.

Jogador da seleção brasileira de vôlei, Anderson mostrou-se contra a resolução do COB.

- A conscientização tem de ser total. Alguém pode se identificar com alguma pessoa e precisar da camisinha - disse o oposto.

Um dos maiores ídolos do time do técnico Bernardinho, o atacante Giovane tem outra visão:

- Não tem necessidade de ter camisinha. O namoro pode acontecer, mas a mente tem de estar voltada para as Olimpíadas.

Companheiro de seleção do atacante, Maurício levantou uma questão com pitada de bom humor:

- Uma camisinha em um kit não tem qualquer problema para alguém casado, que não vai usá-la. Mas pode fazer falta para os solteiros - disse ele, que é casado.

Item será tirado de 235 estojos

Helen Luz, da seleção brasileira feminina de basquete, também acha que o foco tem de ser total nas Olimpíadas. Mas não se incomodaria com a presença de preservativos no seu kit para Atenas:

- Meu casamento é bastante sólido e não se abalaria por causa disso. Isso não tem a menor importância para mim.

Após a exclusão da camisinha, o kit tem itens como solução bucal, esparadrapo, fio dental, creme hidratante, talco e cotonetes. Hoje, o COB guarda em um almoxarifado 235 kits, o número de atletas classificados atualmente para Atenas (119 homens e 116 mulheres). Medalha de ouro no vôlei de praia nos Jogos de Atlanta, Jacqueline Silva disse que hoje em dia a camisinha deve ser encarada como um item obrigatório a ser levado numa bolsa, assim como escova de dentes. A jogadora, porém, afirmou que compreende a atitude do COB.

- Entendo o lado do COB em relação à sua imagem na Vila Olímpica - disse a atleta. 


Fonte: Jornal O Globo.

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